por Frei Alexandre Silveira
A amizade nasce de um encontro. E é justamente isso que acontece entre Deus e nós, seres humanos; Deus veio e vem ao nosso encontro e quer dialogar conosco, ou seja, quer ser nosso amigo. Como está escrito no Catecismo da Igreja Católica (CIC, 142): “Por sua revelação, o Deus invisível, levado por seu grande amor, fala aos homens como a amigos, e com eles se entretém para os convidar à comunhão consigo e nela os receber. A resposta adequada a este convite é a fé”.
Portanto, “a fé é primeiramente uma adesão pessoal do ser humano a Deus e, inseparavelmente, o assentimento livre a toda verdade que Deus revelou” (CIC, 150). Devemos frisar bem que Deus respeita a nossa liberdade, pois foi Ele quem a concedeu; assim, também nós devemos respeitar nossos irmãos que professam outra fé. Pois o homem deve dar uma resposta a Deus voluntariamente; ninguém pode ser coagido a aderir determinada crença.
Infelizmente, ainda hoje, existem pessoas que em nome da fé cometem atrocidades. O “fundamentalismo religioso”, por exemplo, é um grande perigo, pois não aceita outro ponto de vista, a não ser o seu, e, assim sendo, não dialoga com o diferente, se fecha em seu dogmatismo. Também vemos outros extremos, o relativismo, o niilismo… Com tudo isso, muitas pessoas parecem entrar numa crise de fé; sem saberem o fundamento de sua fé, deixam-se levar pela onda do momento ou tentam guardar “tradições” que não são necessárias. Por isso é de extrema importância que procuremos compreender as raízes de nossa fé.

Trecho do Caminho da Fé, realizado pelo MJD-BR em 2012 | Trajeto Tambaú – Águas da Prata
Este é o objetivo do Papa Bento XVI ao proclamar um “ANO DA FÉ”, o qual teve início em 11 de outubro de 2012 e terminará no dia 24 de novembro deste ano. Pois, “não podemos aceitar que o sal se torne insípido e a luz fique escondida (Mt 5,13-16). Também o homem contemporâneo pode sentir de novo a necessidade de ir como a samaritana ao poço, para ouvir Jesus, que convida a crer nele e a beber na sua fonte, donde jorra água viva (Jo 4, 14)” (Carta Apostólica do Papa Bento XVI: Porta Fidei, 3).
Quando nos encontramos com Jesus e aceitamos a sua mensagem, sentimos vontade de ajudar as pessoas a descobrir o dom de Deus dentro das suas vidas. Desejamos compartilhar com elas, assim como irmãos, a nossa felicidade. Afinal, “a fé é aquilo que uma pessoa tem de mais pessoal, mas não é um assunto privado. Quem deseja crer tem de dizer tanto ‘eu’ como ‘nós’, pois uma fé que não possa ser partilhada e comunicada seria irracional” (Youcat, 24).
Sê cremos no Verbo Encarnado, necessariamente, também, devemos buscar a vivência da caridade. Frei Mateus Rocha, O.P., expressou isso muito bem em uma de suas frases: “O amor de Deus não existe abstratamente, fora e acima de nossa capacidade humana de amor: encarna-se num amor humano. Em outros termos, o amor que se tem aos homens é o lugar privilegiado de verificação do amor que se tem a Deus. O amor ao próximo é, assim, uma mediação indispensável do amor a Deus”.
Não podemos separar a nossa fé de nossas opções fundamentais, pois se assim fizéssemos a fé não seria exatamente fé. Ela, necessariamente, deve ser refletida em nossa realidade social. Afinal, verdadeira fé é aquela que nos conduz à caridade, pois “a fé sem obras é morta” (Tg 2, 17). Então, quando nos entregamos, numa atitude de confiança, a Deus, nossa vida muda, pois o sentido de nosso existir não é mais a riqueza, o prazer, o ter…, mas sim o Amor. Este que nos interpela, fazendo com que busquemos, constantemente, sairmos de uma situação cômoda, individualista, egoísta, para ir ao encontro de nosso próximo.

Integrantes do MJD-BR no Assentamento do MST João Canuto | Mutirão Dominicano de 2011.
A verdadeira fé é aquela que nos leva a nos humanizarmos, é aquela que orienta as nossas mentes para soluções plenamente humanas. É isso que diz um trecho do documento Gaudium et Spes: “Movido pela fé, conduzido pelo espírito do Senhor que enche o orbe da terra, o Povo de Deus esforça-se por discernir nos acontecimentos, nas exigências e nas aspirações de nossos tempos, em que participa com os outros homens, quais sejam os sinais verdadeiros da presença ou dos desígnios de Deus. A fé, com efeito, esclarece todas as coisas com luz nova. Manifesta o plano divino sobre a vocação integral do homem. E por isso Orienta as mentes para soluções plenamente humanas” (G.S. 11).
Portanto, Há uma interação entre fé e vida; a fé brota das raízes mesmas da vida propriamente humana. Como o teólogo Walter Kasper expressou em seu livro: “El Dios de JesuCristo”: “O mistério do homem, de seu mundo e da história se transcende a si mesmo. A esta primeira tese devemos acrescentar uma segunda: O mistério do ser humano e do seu mundo implica também a Deus (p. 143)”.
A fé, de uma maneira mais geral, é abandonar-se a dimensão do mistério divino e de entender e sustentar nela a vida. É responder positivamente a Deus, é cultivar a amizade com Ele e, inseparavelmente, dizer sim ao outro. Quem diz crer respeita a liberdade do outro, vê o outro como um bem, como um irmão, filhos do mesmo Pai. Quem diz crer tem fome de justiça, procura ser misericordioso, procura a sua salvação e a dos outros, e, nas crises da vida, suas raízes se fortalecem cada vez mais na busca do Amor, pois “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” (1 Jo 4, 16).
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